Ferreira Gullar
José Ribamar Ferreira (São Luís, Maranhão, 1930 – Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016). Poeta, dramaturgo, tradutor e crítico de artes plásticas. Considerado um dos maiores poetas brasileiros, Ferreira Gullar é autor de obras marcadas por diferentes fases de pesquisa estética, desde o experimentalismo e o lirismo até a poesia de cordel e a dicção coloquial.
Estreia em 1949 com o livro de poemas Um pouco acima do chão. Em 1954 lança A luta corporal, com composições intimistas de forte musicalidade (série Sete Poemas Portugueses), poemas em prosa (como “Carta ao Inventor da Roda”), peças concisas e substantivas que se aproximam de João Cabral de Melo Neto (1920-1999), e textos experimentais que antecipam a poesia concreta pela espacialização das linhas na página, fragmentação da palavra e criação de neologismos.
Ainda em 1954, conhece os poetas Augusto de Campos (1931), Haroldo de Campos (1929-2003) e Décio Pignatari (1927-2012) e participa da fase inicial do movimento concretista, inclusive da 1ª Exposição Nacional de Arte Concreta, realizada no Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo, em 1956. No ano seguinte, dá-se o rompimento com o concretismos com a publicação do artigo Poesia concreta: experiência fenomenológica (1957), no qual Gullar discorda do que considera um racionalismo excessivo da poesia concreta e defende mais subjetividade. Essa posição fomenta a criação do movimento neoconcreto, do qual participam artistas plásticos como Hélio Oiticica (1937-1980) e Lygia Clark (1920-1988) e poetas como Reynaldo Jardim (1926-2011). O “Manifesto Neoconcreto” é divulgado em 1959, no Jornal do Brasil, e nesse mesmo ano é realizada a 1ª Exposição Neoconcreta. As ideias do movimento são expostas na Teoria do não objeto, que Gullar também publicada nesse ano.
O Vil Metal, que reúne poemas escritos entre 1954 e 1960, mostra uma mudança na dicção do autor, com textos discursivos, bem-humorados e em linguagem coloquial, revelando a influência da linguagem conversacional e irônica do Modernismo, e em especial a de Oswald de Andrade (1890-1954) e Carlos Drummond de Andrade (1902-1987).
Em 1962, é eleito presidente do Centro Popular de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE) e dois anos depois se filia ao Partido Comunista Brasileiro (PCB). Com as mudanças políticas ocorridas no Brasil a partir do golpe militar de 1964, escolhe um novo caminho para sua criação, privilegiando os temas sociais e o diálogo com a cultura popular, adotando a poesia de cordel, gênero que pratica entre 1962 e 1967, como em “Quem Matou Aparecida”, “Peleja de Zé Molesta com Tio Sam” e “História de um Valente”.
O compromisso político inspira ainda a redação do ensaio Vanguarda e subdesenvolvimento (1969) e de peças de teatro, como Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come (1966), em parceria com dramaturgo Oduvaldo Vianna Filho (1936-1974), A Saída? Onde Fica a Saída? (1967), em colaboração com os escritores Armando Costa (1933-1984) e Antônio Carlos Fontoura (1939); e Dr. Getúlio, sua vida e sua glória (1968), com o escritor Dias Gomes (1922-1999). O poeta volta a escrever para o teatro em 1979, publicando a peça Um rubi no umbigo. Com a decretação do Ato Institucional nº5 (AI-5), em 1968, é preso com o jornalista Paulo Francis (1930-1997) e os músicos Caetano Veloso (1942) e Gilberto Gil (1942). Obrigado a exilar-se em 1971, reside em cidades como Paris, Moscou, Santiago, Lima e Buenos Aires, e envia artigos para o jornal O Pasquim.
Em 1975, lança Dentro da noite veloz, que reflete o momento histórico, marcado pela Guerra Fria entre Estados Unidos e União Soviética: encontram-se aqui poemas dedicados a temas como a Guerra do Vietnã e a morte de Che Guevara (1928-1967), ao lado de outros que tratam da realidade social brasileira, das paisagens do Rio de Janeiro, da experiência vivida no exílio e ainda do sentimento amoroso.
No ano seguinte, publica o Poema sujo, talvez seu livro mais conhecido e admirado. Escrito durante o exílio em Buenos Aires, esse poema longo é reconhecido pela crítica como obra densa e consistente. O crítico José Guilherme Merquior (1941-1991) destaca que a obra de Ferreira Gullar traz um realismo caricatural do apego à finitude tanto das pessoas quanto das coisas. Marcado por aspectos referenciais como as lembranças da infância e a descrição de cenas do cotidiano da cidade, o poema alcança riqueza rítmica e melódica ao aglutinar as palavras, criando efeitos sonoros que se chocam por vezes com a própria sintaxe.
Em 1977, retorna ao Brasil, escreve para o teatro e a televisão e publica, em 1980, uma edição completa de suas poesias, com o título Toda poesia (reeditada em 1999, com acréscimo de obras posteriores). O mergulho no mundo das memórias e das emoções, presente em Na vertigem do dia (1980), é aprofundado nos dois livros que o poeta publica em seguida, Barulhos (1987) e Muitas vozes (1999) – que retomam as obsessões registradas nos livros anteriores, como a cidade natal, a infância, a família, o cenário urbano do Rio de Janeiro, a realidade social, em versos que recordam a concisão, a geometria e o artesanato formal da primeira fase criativa do poeta.
O escritor é reconhecido também como crítico de artes plásticas, tendo publicado vários títulos nessa área, entre eles Sobre arte (1983) e Etapas da arte contemporânea: do cubismo à arte neoconcreta (1998).
Ferreira Gullar é um dos mais importantes poetas brasileiros do século XX, sobretudo pela redação de Poema sujo, cuja qualidade poética é reconhecida de forma quase unânime pela crítica.
FERREIRA Gullar. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2024. Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa287/ferreira-gullar. Acesso em: 27 de abril de 2024. Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7
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